Crónica do Migas
Beneath this mask there is more than flesh. Beneath this mask there is an idea, Mr. Creedy, and ideas are bulletproof.

09 agosto 2008

 

Prevenção e Pena de Morte


As questões levantadas pelo João Miranda e pelo Carlos Guimarães Pinto relativamente ao caso dos reféns em Campolide e a comparação com a pena de morte são interessantes. Mas incompletas. E o assunto não é de pouca importância, pois o uso do poder de iniciação de força é algo que vai ao âmago das justificações teóricas quer do estado quer de “agências de segurança” num eventual “estado de natureza”. Existem aqui duas questões básicas: A primeira é se é comparável ou não a pena de morte ao uso preventivo de força mortal. A segunda tem a ver com os mecanismos de legitimidade para qualquer uma delas.

A diferença entre a pena de morte e a execução, como chama o João Miranda, dos raptores de Campolide, está no facto da primeira ser uma medida punitiva, teóricamente compensatória, e que se pretende seja dissuasora dos crimes a que se aplica; e da segunda ser uma acção preventiva, cujo objectivo é impedir que o crime venha a ser cometido. Esta diferença é clara, sendo um exemplo extremado da questão que sempre se coloca relativamente ao papel do estado ou de uma “agência de segurança”: Proibir (coerção a priori) ou compensar (coerção a posteriori) as violações de direitos naturais de um indivíduo? E também nela estão patentes todos os aspectos levantados por Robert Nozick na primeira parte de Anarchy, State, and Utopia: Tentamos prevenir as violações de direitos, potencialmente criando injustiças que são elas próprias violações? Ou compensamos as vítimas após a violação, correndo o risco que tal não seja possível ou justo para a vítima, e contribuindo para um ambiente geral de insegurança em que uma ameaça imparável pode estar ao virar de cada esquina?

A pena de morte é um problema ético bicudo. Sendo a vida o direito natural primordial, a sua violação institucional levanta mais questões do que resolve. O argumento principal contra tem a ver com a possibilidade de erro, cuja consequência seria uma injustiça irreversível. Mas mesmo na sequência de crime muito grave, confessado ou apanhado em flagrante, coloca-se o argumento de que se trata de uma violação do direito natural primordial que não vai de modo algum inverter o crime que lhe deu origem. Sobra assim o argumento a favor da dissuasão, que não me convence por aí além, a partir do momento em que a sua execução está sempre tão distante do crime original, que não creio entraria no pensamento do potencial criminoso (excepto se fosse uma pena generalizada, o que levantaria ainda mais problemas).

O caso do uso preventivo de força mortal é diferente. Aqui a situação é de perigo iminente. Existe a possibilidade de um crime capital ser cometido em flagrante. Esta situação limite é o cerne da questão de se é legítimo ou não que o estado tente prevenir crimes. Se não fôr legalmente possível ao estado, ou a uma “agência de segurança”, impedir que uma pessoa mate outra, quando está em condições de o fazer, então nenhuma coerção a priori será legítima, devendo o estado limitar-se a forçar a compensação das vítimas depois do crime. O que num caso destes seria impossível. E contrariamente à pena de morte, a possibilidade de ter lugar esta força preventiva é de facto dissuasora.

Em ambos os casos pode existir erro humano. Mas enquanto no caso da pena de morte o erro ocorre “a sangue frio” e sem sequer haver efectiva compensação da vítima já morta, no caso do uso preventivo de força mortal o erro ocorre na tensão da situação; sendo a vida da vítima efectivamente preservada e havendo indícios fortes (mesmo que eventualmente errados) de que o crime poderia ser cometido a qualquer momento. Uma hesitação que resultasse na morte da vítima seria objectivamente uma falha mais grave.

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Bocas:
Um pequeno grupo de 344 jovens, alegadamente pertencentes a um sortido de minorias étnicas, acercou-se hoje dos clientes de um hipermercado, com intenções que permanecem por esclarecer. Os jovens, todos de arma em punho, deslocaram-se pacificamente e sem perturbar a ordem até ao Continente da Amadora, onde, uma vez chegados, encetaram um projecto de animação multicultural, patrocinado pela Junta de Freguesia da Cova da Moura em sinergia com o ACIDI de Rosário Farmhouse, ao longo de duas horas. Ainda no mesmo local, cerca das 19 horas, o INEM registou 40 feridos ligeiros, 20 feridos graves, 3 em estado crítico, e dois mortos de etnia caucasiana. Tendo recolhido os elementos que foi possível apurar no local, as autoridades, GNR, PSP e PJ revelaram-se "contentes por lhes ter sido possibilitado seguir a Nova Cartilha Pacifista", uma vez que, como é tautológico, ao grupo de jovens não pode, a priori, ser imputada qualquer intenção agressiva, muito menos implicitude nos incidentes que ali terão ocorrido horas depois da sua partida. Fernanda Câncio, Daniel Oliveira e João Miranda já se congratularam em directo na Televisão do Aparelho por mais este passo em direcção ao pluralismo.
 

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