20 dezembro 2007
Entendimento mínimo II
Tem muita piada o Daniel Oliveira acusar o João Miranda de "transformar ideologia em ciência", comparando com o marxismo, e depois apresentar como suporte à sua posição favorável ao salário mínimo as ideias de duas pessoas (os ladrões de bicicletas João Rodrigues e Nuno Teles) que são marcadamente influenciadas pelo marxismo. Também é cómico dizer que o outro lado num debate usa "argumentos de autoridade" e depois apresentar meia-dúzia de "prémios nobel" como contra-argumento. Além da escorregadia linguagem usada pelo João Rodrigues, como a afirmação de que "o salário mínimo não provoca necessariamente desemprego", já abordada pelo BZ, os subtractores de velocípedes omitem dos seus argumentos, convenientemente, quais são os factores que explicam a disparidade observada no crescimento dos salários face ao crescimento da produtividade. Esta disparidade é referida por eles como uma razão para aumentar o salário mínimo e assim "reequilibrar" a relação de forças entre trabalho e capital. Argumento mais marxista seria difícil.
O primeiro factor, e mais directo, é que a globalização aumenta a concorrência no "factor trabalho", ultrapassando distâncias geográficas. Trabalhadores não-qualificados em países remotos oferecem os seus serviços a uma fracção do custo local. Isso deprime o crescimento real dos salários; mas não necessariamente (se ele pode usar, eu também posso) do nível de vida. Hoje em dia, uma família "proletária", mesmo que tendo um vencimento a preços constantes que subiu menos do que poderia potecialmente ter subido, tem acesso a um leque de bens de lazer e qualidade de vida que há trinta anos tinham um custo proibitivo.
O segundo, embora menos directo é muito mais relevante; é que o aumento de produtividade não surge do nada. É tipicamente socialista assumir as coisas como dados adquiridos e partir daí para uma "redistribuição mais justa"... O aumento de produtividade passa geralmente por uma maior aplicação de capital. Por arrasto, esta aplicação leva a um aumento da especialização e formação dos trabalhadores, daí que estes se tornem mais valiosos no mercado de trabalho. Mas não é com essa finalidade que os investidores disponibilizam capital. O objectivo de um investimento é obter um retorno adequado ao risco associado ao projecto. Esse retorno é ele próprio um preço de mercado. Se um projecto não tiver perspectivas de permitir o retorno desejado, os investidores não disponibilizarão o capital.
Etiquetas: dissonância cognitiva, economia, falácias