22 dezembro 2006
Eu sou mais liberal do que tu... toma, toma...
Caro Miguel,
Esperar que todos os liberais sejam unânimes noutros assuntos que não o princípio da liberdade individual e o respeito que lhe é devido é pior que irrealista. É colectivista, e por isso a própria negação de liberalismo. Purgas ideológicas na defesa do purismo são uma característica do Estalinismo e de outros fanatismos políticos ou religiosos.
Esta tendência que alguns liberais têm para se porem em cima da torre de marfim a pontificar sobre as impurezas dos outros lesser liberais é auto-destrutiva. E infelizmente comum, tendo em conta o contexto genericamente adverso ao liberalismo que fomenta uma cultura do tipo "poucos mas bons". É também infantil, na onda do título deste post. Sempre que estas situações se levantam lembro-me deste post do Carlos Guimarães Pinto. Só que fico com a ideia que bastava um monolugar.
Então o André Azevedo Alves é católico. What's the big deal? Ele respeitará menos os direitos individuais dos outros por isso? Certamente que não. As ideias que ele defende habitualmente n'O Insurgente perdem alguma validade por causa da sua religião? De uma forma mais genérica: o facto de não concordarmos com uma ideia defendida por alguém invalida que consideremos as outras com as quais concordamos? É claro que não, e muito menos se essa ideia é uma questão de fé e não de facto, do foro estritamente privado e que em nada interfere na esfera individual de todos os outros indivíduos.
Eu sou agnóstico, mas tive uma educação católica. O que me ensinaram não diminuiu de qualquer modo a minha capacidade de aceitar o liberalismo como algo que defendo naturalmente, nem me impediu de ser fortemente marcado pelo Objectivismo de Ayn Rand quando li os seus livros aos 20 anos de idade (e Rand era mais que agnóstica, era agressivamente atéia). Na verdade, esta educação serviu para que eu possa falar de assuntos religiosos sabendo do que falo e não mostrando a ignorância confrangedora que a maior parte dos não-religiosos mostra quando resolve falar de religião. Permitiu-me ver a influência Aristotélica em São Tomás de Aquino e subsequentemente na evolução do pensamento católico numa direcção compatível (pelo menos em grande parte) com o liberalismo; ao mesmo tempo que reconheço os padrões Platónicos nesse mesmo pensamento - e que já não são compatíveis.
Mas enfim, voltando ao teu post. Dando de barato que alguém idolatra Pinochet n'O Insurgente, o que não é de todo líquido, achas bem fazer um julgamento colectivo em função de uma opinião individual? Vista neste prisma a acusação de "tendências fascistas" não é falaciosa? Não é ela própria iliberal? Tendo em conta as diferenças factuais entre o regime de Pinochet e as ditaduras marxistas, não é lícito que alguém faça o juízo de valor de que a primeira é "menos má" que as últimas (mesmo que possamos preferir dar ênfase a outros aspectos)?
Por fim, apenas uma nota sobre a tua última frase ("Liberais com ligações a religiões meus senhores, só os conheço moderados"). Quando nos conhecemos, fizeste questão de afirmar a tua "moderação" enquanto liberal. "Moderação" que é inevitável para compatibilizares a amálgama de ideias relativamente disconexas dos diversos membros do MLS. É por isso de espantar que alinhes nesta picardia do "sou mais liberal que tu".
Etiquetas: liberalismo, objectivismo
Bocas:
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Uma sociedade liberal é aquela onde todos podem escolher como querem viver, mesmo que "iliberalmente". Este princípio é a pedra no sapato nos liberais de esquerda ("sociais"), mais interessados em impor um ideal liberal do que a deixar que princípios liberais conduzam a sociedade onde ela quiser ir. Quanto à religiosidade dos liberais, recomendo uma revisão dos livros da história do liberalismo.
Resposta ao Migas aqui.
Quanto ao António Costa Amaral, um liberal, precisamente por ser liberal, vai lutar para que uma sociedade não seja Comunista ou Fascista, mesmo que seja para aí que ela quer ir. Precisamente, porque, pelo seu primeiro ponto, numa sociedade liberal "todos podem escolher como querem viver".
Mas isso também vai ter resposta no Speakers Corner.
Quanto ao António Costa Amaral, um liberal, precisamente por ser liberal, vai lutar para que uma sociedade não seja Comunista ou Fascista, mesmo que seja para aí que ela quer ir. Precisamente, porque, pelo seu primeiro ponto, numa sociedade liberal "todos podem escolher como querem viver".
Mas isso também vai ter resposta no Speakers Corner.
Quanto a mim, se as pessoas quiserem viver em sovkhozes ou reconstituições de Auschwitz, adorar Satã ou mesmo (!) ir à missa quando lhes apetece, estão à vontade-- desde que não obriguem os outros a fazê-lo. Nenhuma objecção utilitária pode pôr em causa legítimas liberdades de contrato e de associação (religiosa, inclusivamente), ambas derivadas do princípio básico de self-ownership-- liberdade de consciência e de acção.
"a economia de mercado é um mero instrumento para se chegar ao objectivo último de garantir a liberdade máxima a cada ser humano".
É verdade que a economia de mercado (de ideias, inclusivamente) tem efeitos desagradáveis para quem tem ideais a impor à sociedade; mas o mercado não deixa de ser, por essas indignadas opiniões esquerdistas, o melhor sistema de coordenação humana, porque inteiramente baseado na liberdade do indivíduo, na cooperação voluntária, e num núcleo de direitos individuais bem definidos. A causa liberal deve opor-se às estruturas políticas iliberais quando ilegítimas, assim como às ideias iliberais enquanto ideais políticos-- nunca às convicções dos indivíduos, ou aos seus direitos porque podem ser "mal" usados.
"a economia de mercado é um mero instrumento para se chegar ao objectivo último de garantir a liberdade máxima a cada ser humano".
É verdade que a economia de mercado (de ideias, inclusivamente) tem efeitos desagradáveis para quem tem ideais a impor à sociedade; mas o mercado não deixa de ser, por essas indignadas opiniões esquerdistas, o melhor sistema de coordenação humana, porque inteiramente baseado na liberdade do indivíduo, na cooperação voluntária, e num núcleo de direitos individuais bem definidos. A causa liberal deve opor-se às estruturas políticas iliberais quando ilegítimas, assim como às ideias iliberais enquanto ideais políticos-- nunca às convicções dos indivíduos, ou aos seus direitos porque podem ser "mal" usados.
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