25 agosto 2008
Institucionalização da falácia
Claramente, a falácia de João Marcelino faz doutrina no DN. Num artigo da edição de hoje, "A derrota de Portugal na vitória da Europa", o auspicioso artigo sobre as potências do eixo termina com um aviso à navegação:
«(...) o desporto retrata quase exactamente alguns outros índices económicos e sociais, e em todos Portugal anda pela cauda da União.O(a) autor(a) do artigo também parece achar que mais dinheiro para os atletas vai melhorar "os índices económicos e sociais". Além de achar piada à falácia, também gosto da soberba de uma notícia de jornal que pontifica sobre o que o estado, isto é, quem paga impostos, tem de fazer.
Esta situação deve ser um desafio ao Governo do País (...) O Estado tem de canalizar mais verbas para o desporto de alta competição, e para a preparação do ciclo olímpico.»
Mas a coisa não fica por aqui. A (suposta) notícia termina com um juízo de valor surpreendente, tendo em conta que não se trata de um artigo de opinião:
«Para desculpas e oportunismo tivemos em Pequim que chegasse. Os factos são conhecidos e Vicente Moura deve sair.»
19 agosto 2008
Indicadores de sucesso
A gritante prova da falácia usada por João Marcelino (aqui identificada) é que apesar dos meios disponibilizados pelo estado português para a preparação e participação olímpica, especialmente face ao passado, tivemos todos de testemunhar o episódio do "de manhã só estou bem na caminha", o episódio do "não sou muito dada a este tipo de competições" e o episódio do "agora vou de férias ...
não vou aos 5000 metros, as africanas são fortes; não vale a pena lutar contra elas".
E no fim disto, ainda vem o secretário de estado dizer que "os atletas são melhores a fazer desporto que a prestar declarações". Manifestamente, não são grande coisa em nenhuma das duas.
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11 agosto 2008
Causa ou Consequência?
Quando li a coluna de João Marcelino no DN, onde escreve
«(...) ainda há muito para o Estado fazer pelo desporto no nosso país. Os resultados deste sector, queiram ou não alguns pançudos devoradores de livros e uísque, assumem-se como um importante índice de desenvolvimento.»logo identifiquei a velha falácia da confusão de causas com consequências. Foi por isso irónico que imediatamente depois tenha encontrado o seguinte parágrafo na coluna do João Miranda na mesma edição do jornal:
«Alguém anda a confundir as causas com as consequências. A tecnologia não produz físicos e matemáticos. Os físicos e os matemáticos é que produzem tecnologia. Os alunos portugueses têm hoje acesso a computadores baratos porque alguns dos melhores alunos americanos andaram durante décadas a estudar Física e Matemática. A tecnologia é o resultado de bons alunos. Não são os bons alunos que resultam da tecnologia.»
09 agosto 2008
Prevenção e Pena de Morte
As questões levantadas pelo João Miranda e pelo Carlos Guimarães Pinto relativamente ao caso dos reféns em Campolide e a comparação com a pena de morte são interessantes. Mas incompletas. E o assunto não é de pouca importância, pois o uso do poder de iniciação de força é algo que vai ao âmago das justificações teóricas quer do estado quer de “agências de segurança” num eventual “estado de natureza”. Existem aqui duas questões básicas: A primeira é se é comparável ou não a pena de morte ao uso preventivo de força mortal. A segunda tem a ver com os mecanismos de legitimidade para qualquer uma delas.
A diferença entre a pena de morte e a execução, como chama o João Miranda, dos raptores de Campolide, está no facto da primeira ser uma medida punitiva, teóricamente compensatória, e que se pretende seja dissuasora dos crimes a que se aplica; e da segunda ser uma acção preventiva, cujo objectivo é impedir que o crime venha a ser cometido. Esta diferença é clara, sendo um exemplo extremado da questão que sempre se coloca relativamente ao papel do estado ou de uma “agência de segurança”: Proibir (coerção a priori) ou compensar (coerção a posteriori) as violações de direitos naturais de um indivíduo? E também nela estão patentes todos os aspectos levantados por Robert Nozick na primeira parte de Anarchy, State, and Utopia: Tentamos prevenir as violações de direitos, potencialmente criando injustiças que são elas próprias violações? Ou compensamos as vítimas após a violação, correndo o risco que tal não seja possível ou justo para a vítima, e contribuindo para um ambiente geral de insegurança em que uma ameaça imparável pode estar ao virar de cada esquina?
A pena de morte é um problema ético bicudo. Sendo a vida o direito natural primordial, a sua violação institucional levanta mais questões do que resolve. O argumento principal contra tem a ver com a possibilidade de erro, cuja consequência seria uma injustiça irreversível. Mas mesmo na sequência de crime muito grave, confessado ou apanhado em flagrante, coloca-se o argumento de que se trata de uma violação do direito natural primordial que não vai de modo algum inverter o crime que lhe deu origem. Sobra assim o argumento a favor da dissuasão, que não me convence por aí além, a partir do momento em que a sua execução está sempre tão distante do crime original, que não creio entraria no pensamento do potencial criminoso (excepto se fosse uma pena generalizada, o que levantaria ainda mais problemas).
O caso do uso preventivo de força mortal é diferente. Aqui a situação é de perigo iminente. Existe a possibilidade de um crime capital ser cometido em flagrante. Esta situação limite é o cerne da questão de se é legítimo ou não que o estado tente prevenir crimes. Se não fôr legalmente possível ao estado, ou a uma “agência de segurança”, impedir que uma pessoa mate outra, quando está em condições de o fazer, então nenhuma coerção a priori será legítima, devendo o estado limitar-se a forçar a compensação das vítimas depois do crime. O que num caso destes seria impossível. E contrariamente à pena de morte, a possibilidade de ter lugar esta força preventiva é de facto dissuasora.
Em ambos os casos pode existir erro humano. Mas enquanto no caso da pena de morte o erro ocorre “a sangue frio” e sem sequer haver efectiva compensação da vítima já morta, no caso do uso preventivo de força mortal o erro ocorre na tensão da situação; sendo a vida da vítima efectivamente preservada e havendo indícios fortes (mesmo que eventualmente errados) de que o crime poderia ser cometido a qualquer momento. Uma hesitação que resultasse na morte da vítima seria objectivamente uma falha mais grave.
Etiquetas: ética, individualismo, liberalismo