Como já escrevi antes, “grandes estadistas” não é coisa que aprecie. Mas a velocidade a que se degrada a nossa democracia, semelhante àquela a que aumenta a mediocridade dos nossos representates eleitos, é vertiginosa. Os estadistas querem-se “pequenos” em poder, não em integridade, inteligência ou noutras características que permitam que os estragos que façam sejam os menores possíveis.
Num espírito quixotesco de apelo à razão e a um mínimo de vergonha na cara, deixo aqui algumas notas:
1) O facto de governos anteriores terem faltado a promessas não constitui atenuante na imoralidade do actual fazer o mesmo. O consenso generalizado de que os políticos mentem porque essas são as regras do jogo, em conjunto com a indiferença geral à prática dessa mentira, leva a uma espiral de falta de vergonha que é um perigo para a democracia.
2) As formalidades da democracia existem para garantir que ela continue uma democracia. Quem não se satisfaz com o cumprimento das formalidades apenas mostra desconforto com as mesmas. Quando essa insatisfação vem de alguém que acha que é «a lei que dá a liberdade», quem devia sentir desconforto são aqueles que prezam essa liberdade.
3) As falhas de carácter dos estadistas só são irrelevantes para o desempenho das suas funções políticas quando afectam apenas e exclusivamente a sua vida privada. Se pecadilhos privados podem afectar o desempenho público, as falhas passam a ser relevantes. Se ainda por cima incluem trocas de favores públicos, passam a ser um caso de polícia.
4) O cerrar de fileiras de cada lado da barricada quando estão em causa aspectos que nada têm de ideológicos, como a honestidade ou integridade, apenas serve para criar divisões artificiais que relativizam a imoralidade, a corrupção e o abuso da “coisa pública”.
5) A liberdade de expressão inclui o direito de difundir informações relevantes, legalmente obtidas, sobre os titulares de cargos públicos. Se essas informações forem falsas, existem os tribunais para repôr a justiça. Se não forem, há que retirar as ilações correspondentes. Não se pode é acusar a comunicação social de fazer oposição. Já há barricadas que cheguem.