24 maio 2009
Never knowingly undersold
Acho curiosa a aparente indignação com o facto dos novos painéis relativos aos preços dos combustíveis nas auto-estradas mostrarem preços praticamente iguais. De que estavam exactamente à espera? Numa indústria com um único fornecedor local de produto, com estruturas de custos similares e, acima de tudo, com licenciamento controlado, que mais poderia acontecer?
Paul Geroski, antigo chairman da Comissão de Concorrência do Reino Unido, costumava dizer que existem várias indústrias onde os preços convergem não por concertação explícita mas pela conjugação de factores estruturais da oferta, por um lado, com sensibilidade ao preço fora do normal dos clientes, por outro. Um dos seus exemplos favoritos era a promessa de preço por parte de alguns grandes retalhistas ("se encontrar mais barato, rembolsamos a diferença"). O mais conhecido, sob jurisdição de Geroski, era o da John Lewis Partnership, cujo lema há cerca de 80 anos é «Never knowingly undersold».
Geroski dizia que um dos efeitos dessa promessa é uma convergência de preços na vizinhança das lojas. Convergência em média até mais alta do que seria de esperar face a benchmarks de outros mercados. O seu argumento era que a promessa de preço faz da John Lewis o padrão, isto é, dá-lhe o poder de estipular os preços. A promessa é um compromisso credível de que não adianta aos concorrentes ter preços mais baixos, pois os consumidores podem sempre receber a diferença. Não sendo uma instância de concertação, este "anúncio" é um sinal forte aos concorrentes da política de preços "padrão". Um efeito engraçado é uma posição intermédia em que uma televisão, por exemplo, custa 500 libras na John Lewis e 499 noutras lojas. O mesmo preço, sem ser o mesmo preço, tal como as diferenças de uma milésima de euro nos painéis dos combustíveis.
Os painéis não são uma promessa de preço, mas também funcionam como auxiliar de estipulação de preço. Num mercado em que existem barreiras enormes à entrada, via licenciamento; em que uma porção do mercado está cativa, via cartões de combustível e programas de fidelização; em que os custos operacionais são praticamente os mesmos, por causa do fornecimento e dos modelos de negócios inerentes às concessões das estações de serviço nas auto-estradas; os painéis acabam por reforçar o mecanismo, já de si natural, dos restantes operadores seguirem os preços do líder (neste caso a Galp). Existindo uma sensibilidade ao preço que roça o irracional (pessoas que ficam uma hora numa fila para pouparem 1 ou 2 euros), as diferenças de 1 ou 2 cêntimos que existem fora das auto-estradas entre os operadores mainstream, perante os painéis, têm de desaparecer.
Etiquetas: economia, ignorance is strength, teoria de jogos