Crónica do Migas
Beneath this mask there is more than flesh. Beneath this mask there is an idea, Mr. Creedy, and ideas are bulletproof.

24 abril 2007

 

Dark Eminence


(também postado n'O Insurgente)

Nos últimos dias, a escolha de Pina Moura para a administração da Media Capital, pelos seus proprietários (Prisa, grupo espanhol com ligações aos socialistas lá do burgo), fez correr alguma tinta. O PSD gritou "lobo" e vários comentadores criticaram, por variadas razões. Subitamente, a esquerda viu a luz. "É o mercado a funcionar", disseram. A defesa do mercado é sempre bem-vinda, mesmo quando cheira a hipocrisia. Para que não restem dúvidas, começo por deixar bem clara a minha posição:

1.1) Os accionistas de uma empresa devem ser livres de escolher quem entendem para trabalhar nela; especialmente a equipa de gestão, pois é esta que responde directamente perante eles. A comunicação social não deve ser diferente. Um jornal ou uma televisão são empresas como as outras, mesmo que tenham algum "poder" de influência sobre a "opinião pública".

1.2) É dez vezes preferível que um determinado meio ou grupo de comunicação assuma publicamente as suas inclinações políticas do que finja uma inexistente imparcialidade. As declarações de Pina Moura ao Expresso são por isso de uma franqueza pouco habitual; devem ser bem recebidas, em vez de causarem falsas escandalizações.

Dito isto, não deixa de ser perfeitamente legítimo apontar alguns disparates oriundos da área do PS sobre este assunto. Em primeiro lugar porque tem piada; em segundo porque se não o fizermos eles começam a achar que podem safar-se mesmo quando fazem o que não devem. Eis algumas ideias sobre o tema:

2.1) As leis em vigor para a comunicação social são o resultado de anos de acção legislativa do PSD e do PS. Esta leis, incluindo a da ERC, criada pelo actual governo socialista, incluem várias provisões que pretendem garantir a independência e imparcialidade da informação. Existem sanções previstas na lei para incumprimento. Se qualquer empresa tem fins políticos, como afirma Pina Moura, não seria de eliminar ou clarificar estas provisões na legislação?

2.2) A comparação, feita por Vital Moreira, Pina Moura e pela própria Prisa, com a situação do grupo de Francisco Balsemão é risível. O Expresso foi fundado em 1973, antes de sequer existir PSD. Balsemão não exerce qualquer cargo político executivo desde 1983. A independência editorial deste grupo, relativamente ao seu principal accionista e presidente, é razoável, desde o Expresso, que nunca foi de fazer fretes ao PSD, até à SIC, onde com igual facilidade se faz a cama a Santana Lopes ou a folha a Sócrates. Poderá uma TVI com um "cardeal republicano, laico e socialista" dizer o mesmo?

2.3) Cumprindo algumas formalidades básicas, qualquer um pode criar um jornal. O mesmo não se passa no que toca a uma rádio e, especialmente, um canal de televisão. Estas entidades dependem de atribuição por parte do estado de uma licença que, por inerência, é um bem escasso. Face às limitações à concorrência que este regime de propriedade industrial impõe ao negócio, não seria de reconsiderar a legislação em vigor para ela ficar mais de acordo com as novas inclinações laissez-faire dos socialistas?

2.4) Quando o Helder referiu que as empresas têm como missão dar lucro aos seus accionistas, em resposta à afirmação de Pina Moura de que todas as empresas têm objectivos políticos, houve quem argumentásse que esses objectivos políticos são tão legítimos como o lucro. Sim. Mas como não há almoços grátis, não será de perguntar onde irão os accionistas da Prisa buscar o seu retorno se não é aos cash-flows da Media Capital?

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